A pandemia do coronavírus e o isolamento por ela imposto levaram toda a sociedade a questionar o quanto estamos preparados e adaptados às inovações tecnológicas que o mundo nos proporciona. Home office, processo eletrônico, reuniões e audiências virtuais, aulas online, ensino a distância: ferramentas que já estavam disponíveis há anos, mas que ainda eram pouco ou nada utilizadas, especialmente pela tendência humana a conservar o que já conhece e a resistir ao novo. Contudo, vimo-nos de uma hora para outra obrigados a implementar todos esses meios, sem que tenhamos nos preparado previamente para essa mudança. E aí, vem o choque.
A Justiça do Trabalho, que há anos já havia implementado o procedimento eletrônico como regra – inclusive com alguns TRTs já tendo concluído 100% de migração dos processos para o sistema eletrônico (LINK 1) – parecia a mais preparada para lidar com a virtualização repentina. Mas a primazia dos princípios da oralidade e da concentração dos atos em audiência que regem a Justiça do Trabalho não permitem que o processo corra integralmente sem a realização ao menos uma audiência.
Além disso, considerando que dentre os 15 assuntos mais recorrentes na Justiça do Trabalho em 2020, 9 versam sobre verbas rescisórias (LINK 2), a urgência na solução dos conflitos é especialmente evidente. Nesse sentido, FELICIANO et al (2020) (LINK 3) discutem a possibilidade de adoção de formas síncronas e assíncronas de online dispute resolution na seara trabalhista, bem como as vantagens e desvantagens de cada método.
Aplicativos como WhatsApp, Telegram e outros mecanismos de conversa que caracterizam as formas assíncronas de resolução dos conflitos seriam de utilização mais fácil e intuitiva, permitindo a criação de grupos de diálogo para mediação e conciliação, permitindo otimização da gestão do tempo processual e um melhor diálogo entre as partes, a fim de propiciar maior satisfação quanto à solução alcançada (FELICIANO et al, 2020, p. 9-10).
Todavia, o autor ressalta que esses aplicativos não permitem a garantia total da confidencialidade, além de não propiciarem toda a experiência que envolve a mediação e a conciliação e suas técnicas de aplicação, como o processo de escuta, questionamento e leitura corporal, que compõem a dimensão sociológica do conflito (FELICIANO et al, 2020, p. 10-11; SENA, 2007) (LINK 4).
Mas é preciso lembrar que, às vezes, a adoção de métodos de online dispute resolution pode apresentar um conflito aparente, como em relação ao jus postulandi. FELICIANO et al (2020, p. 11) sustenta que, nesse caso, os procedimentos de mediação e conciliação devem, necessariamente, ser acompanhados pelo magistrado através audiências telepresenciais ou semipresenciais, ou seja, utilizando formas síncronas de resolução do conflito. Porém, isso não responde aos questionamentos de alguns autores quanto à incompatibilidade do jus postulandi com Processo Judicial eletrônico, que requer certificação digital, além de softwares e navegadores específicos (CARDEL, 2017) (LINK 5). Além disso, a prática vem nos mostrando que esses meios estão sujeitos a instabilidades de rede e de plataforma, além de trazer à tona a relevante questão do efetivo acesso aos meios tecnológicos.
Deve-se ressaltar, contudo, que a pandemia não impossibilitou as formas mais tradicionais de diálogo entre as partes, como ligações e troca de e-mails, aos quais os advogados já estão há muito familiarizados. Talvez, no contexto do “novo normal”, a retomada do simples e prático possa ser a melhor forma de dispute resolution, atendendo ao melhor interesse das partes.