À luz da Teoria da Aparência, STJ entende pela validade de compromisso firmado por diretor de base do Cruzeiro, mesmo diante da ausência de poderes para representar a entidade em contratos.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça considerou válido um termo de compromisso firmado pelo diretor-geral de base do Cruzeiro Esporte Clube com uma empresa que gerencia a carreiras de atletas profissionais, mesmo diante do fato do referido diretor não possuir poderes para representar a entidade em contratos, de acordo com o Estatuto Social do Clube.
A controvérsia envolvia um termo de compromisso firmado pelo diretor-geral de base do Cruzeiro com a empresa JRC Serviços Profissionais e Comerciais S/C LTDA., que agencia jogadores profissionais. Pelo termo, a Empresa revelaria ao Clube um jogador e, em contrapartida, faria jus à 30% (trinta por cento) do valor recebido em caso de negociação do atleta.
A Empresa JRC ajuizou uma ação contra o Cruzeiro Esporte Clube requerendo o adimplemento da obrigação, dada a venda do jogador por ela revelado, ao Vasco da Gama. A justiça de Primeira Instância condenou o Clube ao pagamento do valor previsto no termo. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, no entanto, deu provimento à Apelação e reformou a Sentença, alegando a nulidade do termo, uma vez que o funcionário não tinha, de acordo com o Estatuto Social do Clube, poderes para representá-lo em contrato.
Entretanto, no STJ, foi dado provimento ao Recurso Especial N° 1.902.410 – MG, destacando o Ministro Relator Paulo de Tarso Sanseverino, em seu voto que, de acordo com o art. 47 do Código Civil, como regra, as pessoas jurídicas se obrigam apenas pelos atos de seus administradores, exercidos nos limites dos poderes definidos nos atos constitutivos.
Contudo, ressaltou que o caso em questão trata de uma exceção ao referido artigo. Isto porque, o Ministro do STJ aplicou, em sua análise, a “Teoria da Aparência”, entendimento
doutrinário que visa proteger o terceiro de boa-fé que, diante da aparência fiel e íntegra da relação jurídica, é induzido a um erro justificável, sustentado por um suporte fático
plenamente crível, embora divergente da realidade.
No presente caso, portanto, o diretor-geral, durante toda a negociação, se portava como alguém que possuía poderes para celebrar o contrato como representante do Cruzeiro.
Nesta ótica, o Ministro pontuou que o contrato fora assinado pelo diretor-geral de base do Clube, que é, justamente, o responsável pelo departamento que gerencia os atletas, cujos direitos econômicos estavam sendo negociados. Desse modo, à luz da teoria da aparência, ainda que o signatário do contrato não detivesse poderes para firmar tal compromisso, ele ao menos aparentava tê-los, sendo imperiosa a proteção da legítima confiança dos contratantes.
Ressaltou ainda, o julgador, que restou evidenciado, por parte do Cruzeiro, um comportamento contraditório, manifestamente contrário à boa-fé objetiva, na medida em que o Clube buscou impor a terceiro a responsabilidade pela observância à norma do seu Estatuto Social, que fora por ele próprio violada, ao fazer um negócio que lhe gerou proveito econômico.
Por fim, concluiu o Ministro com o seguinte jargão: “àquele que deu causa ao vício não é dado invocá-lo para arguir a nulidade do negócio jurídico”.
Tal decisão é importante para fortalecer o princípio da Boa-Fé, cuja função é estabelecer um padrão ético nas relações obrigacionais, garantindo maior segurança jurídica nos vínculos contratuais.