Quando um grupo de pessoas se une para constituir uma sociedade, tem-se como pretensão criar um ente que funcionará como veículo jurídico para um negócio, sendo que o patrimônio investido não se mistura com o patrimônio pessoal. Em outras palavras, ao criar uma sociedade, os envolvidos buscam a segurança de que o máximo de risco que correm é limitado ao valor investido para iniciar a sociedade.
Por décadas funcionou assim no sistema jurídico brasileiro. Um grupo de pessoas com uma motivação em comum buscando meios de obter lucro através do comércio. Entretanto, uma questão permanecia em aberto. Quando alguém pretendia, individualmente, abrir uma empresa, era necessário buscar meios alternativos à sociedade, vez que essa demanda, necessariamente, o envolvimento de no mínimo duas pessoas.
Assim, o ordenamento jurídico ofereceu opções diferentes, como a possibilidade do indivíduo trabalhar como profissional liberal ou microempreendedor individual (MEI). Ambas as opções, no entanto, não garantem a mesma proteção patrimonial que a sociedade, de forma a criar um ambiente de instabilidade para quem decide investir no seu negócio.
Veja bem, até então, ao constituir uma sociedade, era necessário encontrar sócios que tivessem a mesma vontade, a intenção e a pretensão em aceitar as regras de funcionamento, sendo conhecido no meio jurídico como affectio societatis, um critério de interpretação dos deveres e responsabilidades dos sócios entre si.
De modo informal, para resolver esse problema, muitos dos que abriam uma sociedade colocavam um sócio fictício, sendo, na maioria das vezes, um parente próximo, o qual constava apenas no registro, não participando diretamente dos negócios.
Para sanar essa demanda, em 2011 foi aprovada a Lei 12.441, responsável por instituir no nosso sistema jurídico a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI), instituto que goza das mesmas proteções de patrimônio que as sociedades, não carecendo, porém, da existência de sócio. Assim, como o próprio nome diz, esse tipo de sociedade pode ser titulado por apenas uma pessoa.
Pela primeira vez, a vontade exclusiva do indivíduo passou a ser bastante para constituir o ente em questão, diminuindo, por exemplo, os custos de transação que envolve a constituição.
Dentre suas peculiaridades, vale ressaltar que para constituir a EIRELI, é necessário integralizar, no momento de sua criação, um total de 100 (cem) vezes o maior salário mínimo vigente no país e, ainda, uma pessoa natural só pode titular uma EIRELI. Além disso, não há limitação do faturamento como existe para os MEIs, mas a proteção de patrimônio só é assegurada se não comprovada a execução de um ato ilícito pelo responsável legal, como fraude em licitações ou lavagem de dinheiro.
Compreendido o formato da EIRELI, questiona-se: qualquer um pode titular esse tipo de empresa?
Ora, nesse caso, aplicavam-se à EIRELI as regras utilizadas para as demais sociedades. Conforme o art. 972:
Art. 972. Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos.
Assim era até 08 de março deste ano (2019), em que foi editada a Instrução Normativa nº 55 do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), o qual reconheceu a possibilidade de um incapaz titular a EIRELI, desde que devidamente representado ou assistido, conforme o grau de sua incapacidade, e com a administração a cargo de terceira pessoa não impedida.
Cabe evidenciar que, conforme art. 1.690 do Código Civil, compete aos pais, e na falta de um deles ao outro, com exclusividade, representar os sócios menores de 16 (dezesseis) anos, bem como assisti-los até completarem a maioridade.
A mudança amplia o leque de possibilidades para o exercício da EIRELI, criando ainda mais aberturas para quem deseja constituir, ainda que individualmente, empresa com a garantia de proteção patrimonial. Dessa forma, garante-se, ainda, o respeito ao incapaz, assegurando seu direito de titular a empresa – necessário tornar patente que titular uma EIRELI é diferente de promover a administração dela, sendo que essa função deve continuar sendo exercida por alguém plenamente capaz e que não sofra de nenhum impedimento legal.
O GVM | Guimarães & Vieira de Mello Advogados, atuando nas áreas de Mercado de Capitais, Fusões e Aquisições, Compliance, Societário, entre outras e com equipe de profissionais altamente qualificados, está preparado para atender os anseios de investidores e empreendedores do mercado financeiro brasileiro.
Lucas Zauli Ribeiro é estudante de Direito com formação complementar em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Minas Gerais e atua no Departamento de Direito Societário e M&A do Escritório GVM | Guimarães & Vieira de Mello Advogados. E-mail: lribeiro@gvmadvogados.
Helder Felipe Fonseca Damasceno é Co-Head nas áreas de Direito Corporativo, Societário e M&A do Escritório GVM | Guimarães & Vieira de Mello Advogados. Coordenador de operações de planejamento sucessório/tributário, reestruturações societárias, compliance societário, Project Finance, litígios societários, Merger & Acquisitions e new business development. Palestrante no evento “I Fórum de Direito Empresarial em Energia”, sobre o tema “Funding para novos projetos e recuperação de empresas em risco”. E-mail: hfonseca@gvmadvogados.com.br